domingo, 7 de abril de 2024

MEMÓRIAS DO MOURA BD (3) - 1992: nova entidade organizadora

Texto e pesquisa: Carlos Rico
Fotos: Luiz Beira, Jornal "A Planície" e https://crba.edu.pt/seccao-moura/

 

A partir de 1992, o salão passou a ter como entidade organizadora a Câmara Municipal de Moura, que recebeu o testemunho da Escola Secundária.
O local escolhido para instalar a "2.ª Exposição de BD de Moura" (a designação oficial nas primeiras edições) foi o antigo Café Cantinho, um espaço emblemático da cidade que, após o seu encerramento no final dos anos 80, serviu como sala polivalente albergando iniciativas culturais promovidas pela Câmara ou com a colaboração desta. Ali ocorreram regularmente exposições de pintura, fotografia e artesanato, algumas edições da Feira do Livro, iniciativas escolares diversas... Mais tarde, o espaço seria adaptado a Galeria Municipal de Arte e, um pouco mais tarde ainda, ali passou a funcionar - mantendo-se até hoje - a Secção de Moura do Conservatório Regional do Baixo Alentejo.
Durante três anos (entre 1992 e 1994) ali se instalou o Moura BD. 
Muito bem localizado (na Rua da República, uma das principais do centro da cidade) o local era, contudo, demasiado curto para a dimensão que o salão pretendia um dia atingir. Mas, por ora, era um grande avanço, já que permitia ao salão abrir-se à população, em vez de estar confinado apenas ao público escolar, como na edição inaugural...
Fachada do antigo Café Cantinho, hoje a Secção de Moura do Conservatório Regional do Baixo Alentejo. Assinalada a vermelho a zona do edifício que o Moura BD ocupou em 1992.

Quanto ao salão propriamente dito, tornou a ser constituído exclusivamente pela digressão do material da Sobreda BD desse ano e contou com a presença de Mestre José Ruy (o “Convidado de Honra”) que, no último sábado, explicou ao pouco público presente (o salão ainda não garantira um público fiel) um pouco da sua experiência como banda desenhista e algumas das técnicas que utilizava para criar as suas histórias.
Estiveram também presentes, como representantes do Grupo Bedéfilo Sobredense, Luiz Beira, Mara Andrade, Hélder Carrilho e Rá (isto é, Rui Alves). Alguns destes autores realizaram uma pequena sessão de desenho ao vivo, tal como eu tinha feito durante toda a semana também.
Como nota curiosa, durante o jantar tive a oportunidade de conversar mais demoradamente com José Ruy. Meio a brincar, ocorreu-me perguntar-lhe qual seria a possibilidade de ele realizar, um dia, a História de Moura em Banda Desenhada. Apesar da pronta abertura demonstrada pelo autor, por motivos que, em devido tempo, aqui vos contarei o projecto nunca chegou a ir para a frente. Contudo, esta conversa daria azo a que, anos mais tarde, surgissem não um mas dois álbuns de banda desenhada de que falarei, também, com mais pormenor, em futuros artigos...

(continua)

Um momento de descontração entre os elementos do GBS que visitaram Moura.
Da esquerda para a direita: Hélder Carrilho, eu, Mara Andrade, o luso-finlândes
Stefan Cândido e Ana, a esposa de Rá (que está desenhando, em primeiro plano)

A "Digressão Sobreda BD" era ainda a única exposição do salão.

Jantar-convívio, onde se podem ver (da esquerda para a direita): Álvaro Azedo (adjunto do Presidente da Câmara), Hélder Carrilho, Rá, Ana, Mara Mendes, Stefan (todos do GBS), José Ruy e eu. Falta apenas o Luiz Beira, o autor da fotografia...




Biografia de José Ruy

José Ruy Matias Pinto nasceu na Amadora, a 9 de Maio de 1930. Tirou o curso de desenhador litógrafo na Escola António Arroio (Lisboa). É aos catorze anos que começa a publicar banda desenhada em "O Papagaio". E nunca mais parou, a ponto de se tornar o nosso desenhista com quase toda a sua obra editada em álbum. Dizemos quase, precisamente porque ainda não se recuperaram para a versão álbum, as suas primeiras criações, pormenor que teria e terá muito interesse para os coleccionadores e estudiosos da sua carreira. Citam-se, como exemplos soltos, as histórias "Os Cavaleiros do Vale Negro", "Homens do Mar", "A Bravura de Chico", "Nico e Cartucho em Raptores", "Piratas do Ar", etc.
A sua vasta obra foi, também, publicada através de uma imensidão de revistas como "O Papagaio", "O Mosquito", "Cavaleiro Andante", "Mundo de Aventuras", "Tintin", "Cadernos de Banda Desenhada", "Selecções BD", etc.
Expôs a sua BD pelos mais diversos pontos de Portugal, mas também, no Brasil, Japão, Roménia, Alemanha, China, França e Cabo Verde.
Foi homenageado na Sobreda, Amadora, Moura, Beja, Lisboa, Porto, Setúbal, Bulgária e na cidade de Belém (Brasil). Na sua Amadora natal, uma avenida e uma escola básica, têm o seu nome.
Adaptou para a 9.ª Arte, diversos exemplos literários de Alexandre Herculano, Fernão Mendes Pinto, Wenceslau de Moraes, Gil Vicente, Luiz de Camões, Alves Redol e do brasileiro José de Alencar.
Focou algumas vezes o humor e elaborou algumas histórias de mera ficção e várias biografias, a saber: o Infante Dom Henrique, Nicolau Coelho, Pêro da Covilhã, Wenceslau de Moraes, Gutenberg, Almeida Garrett, Charles Chaplin, Columbano Bordallo Pinheiro, Humberto Delgado, Alves dos Reis, Jorge Dimitrov, Aristides de Sousa Mendes, Martins Sarmento, Leonardo Coimbra e João de Deus.
Elaborou uma sinopse de "História da Cruz Vermelha", traduzida em onze idiomas e distribuída em mais de 150 países.
Alguns álbuns têm versões traduzidas: "A História de Macau" (em cantonês), "Aristides de Sousa Mendes" (em hebraico, francês e inglês) e, no nosso dialecto mirandês, "O Mirandês", "Os Lusíadas" e "João de Deus".
A título de curiosidade, indicam-se alguns títulos-álbuns fundamentais da bibliografia de mestre José Ruy: "O Bobo", "Os Lusíadas" (três tomos), "Levem-me Nesse Sonho", "A Ilha do Futuro", "As Aventuras de 4 Lusitanos e 1 Porca", "Ubirajara", "Amarante", a série "Porto Bomvento", "Humberto Delgado", "Peter Café Sport e o Vulcão do Faial" (edição elaborada nos Açores), o álbum colectivo "Salúquia", "Autos das Barcas", "Farsa de Inês Pereira", "Auto da Índia", etc, etc.
José Ruy faleceu a 23 de Novembro de 2022, aos 92 anos, tendo trabalhado afincadamente quase até ao final da vida (apenas parou no último mês, quando a doença já não lho permitia).
Já depois de falecer foram publicados os seus últimos trabalhos: "Lendas Japonesas" e "O Mistério dos Templários" (dois belos álbuns, com edição Polvo) e "A Passagem Impossível" (a derradeira obra, que deixou toda esboçada e legendada, com poucas páginas entintadas, mas que mereceu a aposta da Ala dos Livros e obteve, quase unanimemente, a aclamação da crítica e dos leitores).





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