quarta-feira, 22 de abril de 2015

A VIDA INTERIOR DAS REDAÇÕES DOS JORNAIS INFANTO-JUVENIS na memória de José Ruy (6)


6) NOVOS COLABORADORES

Descrevi no artigo anterior a minha chegada à redação de "O Papagaio" e as diferenças em relação à d’O Mosquito. As experiências foram diferentes, mas aproveitei-as para alicerçar os meus conhecimentos tanto na arte gráfica como na técnica de trabalhar as ilustrações para serem reproduzidas.
Depois de estar mais ambientado na redação d’O Papagaio levei comigo o meu colega da Escola António Arroio, o Vítor Silva, que sendo o mais novo era de todos nós o que melhor desenhava já. Ficou também colaborador, o que podemos chamar de residente.
O Carlos Cascais era uma pessoa simpática e conhecedora do assunto, e em vez de me dispensar das colaborações, até estar mais maduro como seria lógico, pelo contrário continuou a apoiar-me. Encetámos uma boa amizade e o ambiente na redação tornou-se até familiar.
Alguns estudos à pena que fiz do Carlos Cascais (em cima, à esquerda), destinados a ilustrar um conto,
e do seu filho (em cima à direita) que usei também como modelo para a história "Homens do Mar" (em baixo),
com argumento de outra colega da escola, Margarida Ângela, que também levei para a equipa de "O Papagaio".
A Margarida viria a ser também a autora do argumento da primeira história do Garcês
publicada n' O Mosquito e intitulada "O Inferno Verde"

Pois o Artur Correia, que aparecera pelo seu pé, era vizinho do Vítor Silva e do Garcês, e só muito mais tarde, por via deste último colega nos aproximámos. Desenhava um género cómico ou humorístico em que viria a afirmar-se.
Página de uma história com desenhos do Vítor Silva...
...e também desenhos do Artur Correia que enviara para a colaboração dos leitores, chegando depois a fazer algumas histórias ilustradas com argumento de um amigo seu que assinava "Carlos Seca" (?) 

Esses encontros na redação prolongavam-se a trocar impressões e conversas.
Por vezes aparecíamos à noite, depois do jantar, quando o nosso estudo e o trabalho o permitiam. No entanto nada comparável com a tertúlia da redação de "O Mosquito".
Confraternizávamos já com os operadores e locutores do Rádio Renascença, cujos estúdios ficavam ao lado da sala da redação, separados por um corredor. Pelas vigias circulares nas portas à prova de som, espreitávamos curiosos o aspeto do seu interior.  
A partir de uma certa hora da noite punham música gravada em bobinas de fita com longa duração, e os locutores mais livres nessa altura costumavam vir larachar connosco um bocado vendo os desenhos e contar histórias. Depois deixavam-nos ir ao interior dos estúdios enquanto transmitiam os pacotes de música cujos títulos iam anunciando de espaço a espaço.
Eu e o Vitor Silva pedíamos-lhes para colocarem no ar músicas do nosso agrado, como o «Bolero» de Ravel, «Scheherazade» e «O Voo do Moscardo» de Rimski Korsakov, «A Dança Ritual do Fogo» de Manuel de Falla e outras que escutávamos enlevados pelos altifalantes instalados nas outras salas. Era um fascínio; para nós essa componente sonora fazia parte integrante da redação.
Um dia o José Garcês pediu-me para o apresentar no jornal, o que achei dispensável, pois era lógico ele apresentar-se sozinho sem precisar de padrinho. Mas fez questão e lá o «levei pela mão». Chegou a fazer umas três aventuras.
"Tonito Cowboy", uma das três histórias que José Garcês publicou n' O Papagaio
O José Garcês atingira já nessa altura uma craveira cimeira, pois era também o mais velho do grupo. Começou a publicar os seus originais depois de nós, por conselho do Mestre João Rodrigues Alves que achava ser preferível ele esperar algum tempo mais até alcançar um nível mais maduro. E tinha razão, a idade influi muito no modo de observar as coisas. Aos dezoito anos temos uma melhor capacidade de visão e na maneira de conseguir resultados do que aos catorze. Estávamos todos a começar e "O Papagaio" proporcionou-nos essa experiência e a maturação indispensável através da prática e observação do resultado entre o que desenhávamos e a impressão no papel.
Toda a colaboração tinha de ser realizada também com um avanço em relação à data da publicação, sem ser necessário entregar a história completa. Também não nos marcavam limites no número de páginas nem impunham temas. Havia uma liberdade total.
(Continua)

No próximo artigo: ALTERAÇÕES NA REDAÇÃO 

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