Carlos Roque (1936-2006) |
Como muitos outros autores portugueses da sua geração, estudou na Escola António Arroio, onde tirou o curso de Desenhador-Gravador-Litógrafo.
Estreou-se na banda desenhada, em 1959 (tinha apenas 23 anos), na revista "Camarada" II série, com "O Cruzeiro do Caranguejo" (que quatro anos mais tarde, em 1963, seria reeditado em álbum).
Colaborou em "O Século", "O Século Ilustrado", "Modas e Bordados", "Vida Mundial"...
Emigrou para a Bélgica, em 1964, para fazer parte da equipa da revista Tintin, onde trabalhou no departamento de publicidade e publicou algumas curtas BD's, com textos de Yves Duval.
"Soyez Bons Pour les Animaux" ("Sejam Bons para os Bichinhos"), história com referências a Portugal, com argumento de Yves Duval, publicada na revista "Tintin" (belga) #8, em 1966. Repare-se, na última vinheta, nas caricaturas de Roque e Duval.
Em 1965, mudou-se para a concorrente Spirou onde, para além de colaborar com bandas desenhadas, chegou a maquetista e paginador da revista. Aí reeditou "O Cruzeiro do Caranguejo", em 1979.
De parceria com a sua companheira, Monique (autora dos textos), Carlos Roque criou, nos anos 60, "Angelique", um "pequenino tornado", cuja personalidade é oposta ao nome que ostenta.
Os belgas Raoul Cauvin e Charles Jadoul também colaboraram com alguns argumentos para esta série.
"Angelique", maravilhosamente desenhada pela mão de Carlos Roque
Tal como "Angelique", o pato "Wladimyr" é também uma criação do casal Roque.
De início, Carlos não se mostrou muito entusiasmado com a ideia de Monique. Desenhar as aventuras de um pato (e de uma rã), num lago, prometia ser uma tarefa de pouco sucesso: o cenário tornar-se-ia, inevitavelmente, repetitivo e os assuntos talvez se esgotassem rapidamente.
Contudo, à medida que ia trabalhando, Carlos começou a gostar do personagem e percebeu que este tinha potencial para desenvolver bastantes aventuras. A arte de Carlos e os argumentos de Monique (que, com o tempo, foram acrescentando personagens à série) fizeram o resto e "Wladimyr" tornou-se na mais querida criação do casal Roque, chegando, inclusive, a ganhar o prestigiado Prémio Saint-Michel, em 1976.
"Wladimyr" teve as suas aventuras publicadas em português, na revista "Selecções BD" |
Quando, em 1999, surgiu no mercado português a revista "Selecções BD", dirigida por Jorge Magalhães, este, movido pela admiração e amizade que os unia, não perdeu tempo a convidar Carlos Roque para realizar alguns sumários da revista (que eram sempre apresentados em formato de meia-prancha) bem como a publicar "Wladimyr".
Em "Selecções BD", o "Western" serviu de tema para introduzir o sumário da revista. |
Outro sumário da mesma revista, mas aqui o tema escolhido foi bem mais "ligeiro"... |
Com o regresso a Portugal, nos anos 90, foi responsável pelo suplemento TV Guia Júnior, onde publicou passatempos e banda desenhada ("Tropelias do Malaquias", "Patrake", "Medo! em Vale de Cães"...)
"Tropelias do Malaquias", in suplemento "TV Guia Júnior"
Outra criação do casal Roque, "Patrake" (baptizado assim por Monique, mas que, inicialmente, estava para se chamar "Mandraço"!), é uma paródia/homenagem ao célebre mágico Mandrake.
As aventuras de "Patrake" são histórias, em oito vinhetas, onde o traço e a imaginação de Carlos comprovam o génio do artista.
Aventura de"Patrake" publicada no suplemento "TV Guia Júnior" |
Em 2011, já depois do seu falecimento, foi alvo de uma homenagem durante o Salão Moura BD. Aí esteve patente uma exposição de belíssimos originais seus (que depois seguiram para a Amadora, para integrar o Festival daquela cidade). Monique, a sua companheira, recebeu, com emoção mas também com orgulho, o Troféu Balanito Especial, que o Moura BD outorgou postumamente a Carlos Roque.
Estranhamente, não existe, hoje em dia, nenhum álbum deste autor. "O Cruzeiro do Caranguejo", já foi publicado há mais de meio século! Parece mentira, atendendo à qualidade do trabalho de Carlos Roque e ao avultado número de histórias que desenhou...
Carlos faleceu em Louvain (Bélgica), faz hoje precisamente dez anos! Com o seu desaparecimento, desapareceu também um dos maiores autores portugueses de banda desenhada de sempre. Saibamos honrar a sua memória e a sua obra.
CR
Quero dizer-vos, com muita admiração, que este post do BDBD constitui uma belíssima homenagem ao saudoso Carlos Roque, e que merece por isso os maiores elogios. Não deixarei de o citar à Monique, que certamente sentirá um grande prazer ao lê-lo, pois tenho a certeza de que não se passa um dia sem que ela se lembre do Carlos.
ResponderEliminarFoi pena nenhum editor se ter lembrado também desta efeméride para reeditar algumas das suas obras, como "O Cruzeiro do Caranguejo" ou o "Malaquias", por exemplo. Fazem falta hoje humoristas com o seu talento e uma arte gráfica exemplar que buscava sempre novos caminhos, como demonstrou com as colaborações inéditas para a "Selecções BD", já no fim da sua carreira. Penso muitas vezes no que ele poderia ainda ter criado, para gáudio de todos os seus admiradores, se a morte não o tivesse arrebatado tão cedo. O Carlos era um daqueles artistas que têm a cabeça sempre cheia de projectos. Mas em Portugal, infelizmente, foram muito poucas as oportunidades que encontrou para os concretizar, mesmo tentando por todos os meios remar contra a maré. Além disso, era um autor muito exigente com o seu trabalho, o que lhe dificultava a produção em série, como outros conseguiam fazer para conquistar a sua quota de mercado. Conheci-o bem, numa camaradagem de muitos anos, que começou na nossa juventude e se estendeu até ao seu último mês de vida, e por isso sei que esse era um dos seus "dramas": trocar a qualidade e a exigência pela rapidez. Mas o que o matou não foi a falta de trabalho e a desilusão com o nosso estagnado meio da BD (que o fazia sentir ainda mais saudades da Bélgica)... foi o vício de fumar, tão dominador que nunca o largou, mesmo tendo plena consciência de que os seus pulmões estavam por um fio!
Um grande abraço ao Carlos e ao Luiz, com renovados parabéns pelo vosso excelente blogue, que acompanho sempre com o maior interesse.
Jorge Magalhães
Amigo Jorge,
ResponderEliminarMuito obrigado pelas suas palavras. Vindas de quem vêm, mais orgulhosos nos faz sentir.
Pois o Carlos era, sem dúvida, um artista extraordinário. O seu traço é dos melhores que conhecemos em desenhadores humorísticos (o próprio Franquin elogiou o seu trabalho por diversas vezes, se não estamos em erro)...
Como é possível desenhar-se tão bem, aos 23 anos, como o fez o Carlos, quando desenhou "O Cruzeiro do Caranguejo"? Não há dúvida que era um predestinado.
E, como diz e bem, tinha a cabeça cheia de projectos.
Todos os artistas a têm, no fundo. A diferença é que uns não concretizam tudo o que pensam por preguiça e outros por não conseguirem acompanhar o ritmo das suas próprias ideias, por mais horas que trabalhem. O Carlos era um desses casos.
Que pena ter partido tão cedo, com tanto que ainda podia fazer.
Quanto à Monique, uma jóia de pessoa, tínhamos, precisamente a ideia de lhe encaminhar este post mas como não temos o endereço electrónico dela, vamos aproveitar a sua ajuda, Jorge, para lhe fazer chegar este post.
Muito obrigado, mais uma vez.
Um grande abraço para si e beijinhos à Catherine.
Carlos Rico e Luiz Beira