domingo, 8 de agosto de 2021

ENTREVISTAS (33) - DERRADÉ

Derradé
Já conhecia, superficialmente, algumas bem animadas criações de Derradé, mas não o conhecia pessoalmente...
O seu recente álbum, "A Loja" (ed. Polvo), despoletou todo o desafio para esta merecida entrevista, se bem que breve.
Derradé (aliás, Dário Rui Duarte) é um dos grandes e incontestáveis valores de uma nova geração de desenhistas portugueses. Em boa aposta, ele singra pela difícil vertente do humor e de bem fazer rir e sorrir. A sua já notável obra espalha-se por alguns álbuns, sobretudo editados pela Polvo e pela Escorpião Azul, e por participações diversas em fanzines e outras publicações e antologias, numa bela e infindável lista.
Tem participado em grandes festas-BD, como a de Beja e da Amadora. 
Com frequência, faz parceria com argumentos do economista e saxofonista Geral (aliás, Mário Alberto Caldeira Cavaco). Muito cúmplices e muito divertidos e a divertir os leitores. Espantosos!
Na obra de Derradé, para além do já citado álbum "A Loja", há que salientar: "A 25, Sempre a Abril", "Edição Extra", "Fava!", "Fúria", "Pai Natal, Um Estudo Morfológico", "Segunda Oportunidade", "A Demanda do G", os três tomos de "Há Piores!" e todas as suas loucuras por fanzines e não só.
Nasceu em Lisboa a 15 de Outubro de 1971. 
Licenciou-se em Matemáticas Aplicadas e é analista e programador de Informática.
Em 1992, iniciou-se na Ilustração, no Cartune e na Banda Desenhada.
Colaborou e/ou colabora para várias publicações mais ou menos conotadas com a 9.ª Arte, como o "Jornal de Alverca". Editou diversos fanzines e expôs em Alverca (2000, 2001 e 2002), na Amadora (2011 e 2019) e Beja (2016). 
Recebeu o Troféu Central Comics, em 2012 e em 2017. 
Tem álbuns completamente esgotados, como "Segunda Oportunidade".
Por sua vez, no álbum "Edição Extra" há uma inteligente compilação de obras que estavam dispersas.
Aí segue o nosso "diálogo".
LB

BDBD - Como e quando te surgiu a aproximação à Banda Desenhada?
Derradé (D) - Desde miúdo. Aprendi a ler com a BD, em revistas como "Tintin", "Tio Patinhas" ou "Turma da Mónica". Depois, tinha um certo jeito para desenhar, o que também ajudou. E tenho a certeza que o desprezo com que alguns adultos a votavam me influenciou teimosamente a não largar a BD...

BDBD - Algum ou alguns desenhistas te influenciaram?
D - Sem dúvida. Há aqueles que esperamos que se vejam no nosso trabalho e há aqueles que surgem no teu trabalho e que julgavas que nunca te influenciariam: Angeli, Laerte, Glauco, Peter Bagge, Gilbert Shelton, Joe Matt, Morris e Maurício de Sousa.

BDBD - De todos (são tantos) os desenhistas portugueses, quais os teus favoritos?
D - Vou-me escusar a responder a esta questão, com uma única excepção: o meu velho companheiro de luta pelo humor em Portugal, o Álvaro.

BDBD - A mesma questão em relação aos estrangeiros...
D - Para além dos que me influenciaram: Lewis Trondheim, Joaan Sfar, Mathieu Sapin, Seth, Daniel Clowes, Jeff Smith, Carl Barks, Prett, Franquin, Tillieux, Serge Clerc, Yves Chaland, Quino, Bill Waterson, Richard Thompson, Hunt Emerson...

BDBD - ​​Aplicas-te essencialmente ao humor, às vezes com a bela malícia cáustica. A BD realista não te atrai?
D - Eu sou autodidacta. Os meus desenhos mais realistas acabam sempre com um ar cartunesco, o que quer dizer que só leio Humor a 100 %, mas gosto de um desenho que foge do real e que se estiliza, que se cartuniza.
Capa de "Pai Natal: um estudo morfológico", por Geral (texto) e Derradé (desenhos)
Edições Polvo (2001)

BDBD - Em "A Demanda do G", ajustas em cada prancha, em baixo e como rodapé, uma tira de divertida discussão entre o "desenhista" e o "argumentista". É ideia tua, do Geral ou de ambos?
D - A ideia de usar esse sistema no livro foi do Geral. A contribuição do Geral para esse livro, foi exactamente essa estrutura, as duas primeiras páginas, a última e duas tiras. Mas a ideia não é nossa, mas sim do que o Gilbert Shelton costumava fazer nas pranchas dos Freak Brothers, com as tiras do Fat Freddy's Cat.
Capa e prancha de "A Demanda do G", por Geral (texto) e Derradé (desenhos)
Edições Polvo (2016)

BDBD - Em "Há Piores", por exemplo, funcionam os sonhos e as frustrações erótico-sexuais. Há alguma base autobiográfica nesta linha?
D - Há sempre algo de autobiográfico em qualquer personagem que criemos. Neste caso, quem sabe? Quando fazemos BD também fazemos um pouco de terapia. A série "A Paixão Segundo Derradé", incluída no "Há Piores!... 3", surgiu de um desafio que me foi lançado pelo Nuno Amado do blogue "Leituras de BD" e é abertamente mais sexual. Foi uma experiência engraçada.
Capa e prancha de "Há Piores 3#, por Geral (texto) e Derradé (desenhos)
Edições Polvo (2014)

BDBD - Por sua vez, no bem pândego álbum "A Loja", parodias-te a ti próprio e ao universo-BD português. Excluindo a diversão que aí consta, é assim que julgas mais seriamente toda esta situação?
D - Olhando friamente, sim. Aliás, acho que é mais irreal do que a parodiei, digna de uma certa aldeia de gauleses, mas que ao contrário destes, não resistirão ao invasor romano. Já me pediram um segundo livro, mas não será para já. Histórias não faltam...
Capa e prancha de "A Loja", por Derradé (texto e desenhos)
Edições Polvo (2019)

BDBD - Em certos momentos, incluis figuras reais (Garcia Lorca, Serge Gainsbourg, Vinicius de Moraes, etc.). São autores da tua simpatia e aparecem, ao teu jeito, como um certo tipo de homenagem?
D - Sem dúvida. Sempre que puder, e fizer sentido, irei incluir esse tipo de homenagens. Aliás, todo "A Demanda do G" é, de certo modo, uma homenagem ao Joe Strummer.

BDBD - E a seguir, o que tens planeado?
D - A reforma!... O tempo escasseia e terei de ser mais criterioso com os projectos que ainda me proponho idealizar. Assim, estou a terminar para a Escorpião Azul, o que posso definir como uma autobiografia fictícia pós-apocalíptica viral. Depois, tenho mais quatro projectos para a Polvo. Tudo irá ser feito a seu tempo e sem pressas.

Registo o meu agradecimento pleno pelos apoios para esta entrevista, para além do do próprio Derradé, os das editoras Polvo (Rui Brito) e Escorpião Azul (Jorge Deodato).
Avante, pois parar é morrer antes do tempo!
Luiz Beira

Capa de "A 25, sempre a Abril", por Geral (texto) e Derradé (desenhos)
Edições Polvo (2002)

Capa de "Segunda Oportunidade", por Geral (texto) e Derradé (desenhos)
Edição Escorpião Azul (2013)


Capa e prancha de "Edição Extra", por Geral (texto) e Derradé (desenhos)
Edição Escorpião Azul, 2015) 

3 comentários:

  1. Respostas
    1. Só queria dizer que adorei A Loja! Foi uma lufada de ar fresco no que eu pensava da BD e do humor português. Adorei como o livro foi capaz de misturar a comédia com uma grande sinceridade emocional sobre os temas tratados. É algo que muitos tentam mas poucos conseguem e que mostra a paixão do autor.

      Os mais sinceros parabéns de alguém que gostaria de publicar um livro de bd um dia... MAS QUE NUNCA SERÁ ESCRITO EM COMIC SANS!

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    2. Que bom que gostaste da Loja. E Força nesse sonho de publicar um livro de BD!... Tem graça que é exactamente esse um dos temas do meu livro mais recente: O Fogo Sagrado, editado desta vez pela Escorpião Azul, não sei se já conheces. A BD é realmente uma paixão e é bom que tenha conseguido partilhar isso com quem lê. Abraço.

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