12) O «TINTIN» PORTUGUÊS
Em 1968 por iniciativa de Jaime Mas, o catalão filho de
Francisco Mas da Editorial Íbis, iniciou-se a publicação em Portugal de uma revista
congénere da «Tintin» belga. A editorial Íbis e a editora Livraria Bertrand
eram sócias e nessa altura eu trabalhava nesta última fazendo capas de livros e
publicidade às edições, incluindo cartazes para decorar as montras das várias
lojas que possuíam, espalhadas pelo país.
Capa do primeiro número da revista "Tintin" |
Esta revista impôs-se pela qualidade gráfica e pela criteriosa escolha das histórias, num cuidadoso equilíbrio dos temas, o que levou a ser considerada pelos editores belgas a melhor de entre as muitas com o nome «Tintin» editadas na Europa e mesmo em outros continentes.
Na distribuição da colaboração, deixaram 20% do espaço
nas páginas da revista para ser preenchido com histórias feitas em Portugal, e
foi convidado o Vítor Péon para preencher esse espaço, que logo no número 1 e
em página dupla publicou «A 1.ª Travessia Aérea do Atlântico Sul». Estamos a
falar, claro, da proeza de Sacadura Cabral e Gago Coutinho num voo sobre o Oceano
até ao Brasil.
Página dupla de Péon na sua melhor fase. Como foi scanerizado de um volume encadernado, nota-se o ressalto do medianiz devido à dobra, "comendo" um pouco de desenho e letras. |
Uma página e parte de outra onde Péon começou a preencher a rubrica com a nossa ligação com África, primeiro no tempo dos Descobrimentos e depois nas campanhas militares do Séc. XIX |
Assim o Tintin transformou-se numa revista totalmente franco-belga
traduzida para a nossa língua.
As legendas eram todas desenhadas, como se havia convencionado
internacionalmente (mas nem sempre cumprido) que os textos da banda desenhada
precisavam de ser igualmente desenhados. Como eram muitas páginas a publicar
semanalmente e o Mário Correia, nessa altura já grande profissional de
«rotulação» e funcionário da casa, não podia sozinho dar vasão, foi necessário
criar uma equipa.
Compunha-a o Mário Correia, o Teixeira Abreu orientador
gráfico da Íbis, o Luís Nazaré funcionário da Bertrand e sobrinho do Aníbal
Nazaré, que era autor de textos para revistas teatrais, o Strompa, nessa altura
montador de Offset nas oficinas da Editora Bertrand e eu. Eu era dos mais
fracos a legendar.
Foi necessário que acertássemos o desenho da letra de
modo a que não se notasse diferença de umas páginas para outras. Todos tínhamos
de trabalhar na mesma dimensão, o mesmo recorte e a mesma espessura da letra.
Fomos obrigados a um treino intenso e tomando por padrão o
tipo de letra usado pelos franco-belgas.
Entretanto a editora decidiu também publicar álbuns com
as histórias completas em paralelo com a revista, e as respetivas rotulações
tinham de ser executadas num curto espaço de tempo. Levávamos para casa um
desses álbuns com 44 páginas à sexta-feira para entregarmos tudo pronto após o
fim-de-semana. Dividíamos então as páginas pelos cinco e não poderia haver
diferença significativa na escrita.
As legendas eram executadas sobre papel vegetal, com canetas «Rotring» carregadas a tinta-da-china para ficar mais preta, sobre as páginas originais francesas ou belgas e tinham de caber nos espaços de origem, pois não havia hipótese de se mexer nos balões ou nos desenhos.
Esses vegetais eram montados sobre os fotólitos do
desenho a preto cedidos pelas editoras estrangeiras e gravados nas chapas
Offset, para a edição em português.As legendas eram executadas sobre papel vegetal, com canetas «Rotring» carregadas a tinta-da-china para ficar mais preta, sobre as páginas originais francesas ou belgas e tinham de caber nos espaços de origem, pois não havia hipótese de se mexer nos balões ou nos desenhos.
Se a tinta não ficasse bem negra, falhava na passagem à
chapa. Também não se admitiam rasuras, e se nos enganávamos tínhamos de
reiniciar tudo nessa página, pois qualquer raspagem, corte e colagem ficaria
marcado sobre o desenho original. Era verdadeiramente um trabalho sem rede que
exigia ficar pronto à primeira.
O facto é que criámos uma homogeneidade tal, que por
vezes não sabíamos definir quais as páginas que tinham sido legendadas por nós
próprios.
A revista tinha publicidade, alguma de página inteira,
para desespero do Dinis Machado que achava estar a retirar ao leitor a
possibilidade de ler mais uma aventura. Foi quando entrou em cena a «Agência
2000», de um francês radicado em Portugal.
Saíram várias historiazinhas destas onde a publicidade era bem aceite
pois continha ela própria uma aventura.
Mas o Dinis Machado lutava para conseguir na revista umas
páginas extra onde pudesse anunciar aos leitores as histórias seguintes.
Tanto insistiu com a administração que acordaram incluir 4
páginas, como se fosse um suplemento, em papel inferior ao do resto da revista e
impressas só a preto. Chamou-lhe «Tintin por Tintin» e reuniu aí a secção de respostas
às cartas dos leitores «Tu Escreves Tintin Responde», artigos sobre os autores
franco belgas que o Vasco Granja traduzia do francês. Deu-me carta-branca para
elaborar composições a anunciar as novas aventuras a publicar quando as
anteriores iam terminando.
(Continua)
No próximo artigo: A REDAÇÃO DO TINTIN,
REALIDADE OU FICÇÃO?
Sem comentários:
Enviar um comentário