3) AS DECISÕES NA ORIENTAÇÃO DO JORNAL
Como exemplifiquei no artigo anterior, o António Cardoso
Lopes, Tiotónio, diretor artístico de «O Mosquito» funcionava como um maestro que
perante um naipe de instrumentistas ia dando ordem de entrada a cada um ou a um
grupo, conforme achava que a sinfonia ia precisando.
Claro que essas decisões não eram diárias, a redação
reunia uma vez por mês, sem dia certo, e estavam presentes além dos diretores,
o Eduardo Teixeira Coelho, o José Padiña, a partir da altura em que iniciou a
sua colaboração no jornal e o Roussado Pinto depois que o seu jornal «Pluto» acabou e o Tiotónio o acolheu na redação de «O Mosquito». Por vezes reuniam de
emergência, como uma vez em que as vendas de «O Mosquito» baixaram numa semana,
embora pouco, e era preciso tomar medidas urgentes, novas ideias, novos
estímulos.
Foi quando por sugestão do Teixeira Coelho coadjuvado
pelo Raul Correia, surgiram rubricas como «Curiosidades de todo o mundo», «A
História do Carro», «Secção dos Sábios», «Coisas do Arco-da-Velha» e «Mulheres
Celebres».
O Tiotónio, para não sobrecarregar a tipografia, muitas vezes escrevia as legendas
diretamente na chapa de zinco, como nesta página das «Curiosidades».
|
Mas as novas rubricas não podiam sair logo nessa mesma
semana, e quando surgiram à cena já o jornal tinha recuperado as vendas, antes
de qualquer alteração. O Tiotónio dizia que o êxito em volume de vendas era uma
incógnita. Podia-se planear tudo rigorosamente para dar certo, mas o resultado
era imprevisível. Ainda hoje é assim.
A colaboração tinha um avanço de algumas semanas em
relação à sua publicação. As provas das histórias inglesas chegavam em pequenos
lotes, com irregularidade devido aos efeitos da Segunda Guerra Mundial e alguns
episódios perderam-se por terem sido bombardeados os navios que traziam esse
correio. Daí as falhas na sua publicação, obrigando a dar pequenos saltos na
história, que o Raul Correia compensava num texto a fazer ligação com as cenas
anteriores.
Felizmente o autor José Pires de parceria com o Américo
Coelho, colecionador, e o José Vilela, editor, têm atualmente publicado essas
aventuras completas em livro com as páginas originais que falharam n’ «O
Mosquito». E é curioso como tem tido a melhor aceitação da parte dos ingleses.
Esse avanço permitia ao seu autor evitar a interrupção de
uma história se algo lhe acontecesse, mesmo temporariamente. Em 1946 o Teixeira
Coelho teve um esgotamento devido ao muito trabalho que desenvolvia. Esteve
umas semanas em repouso, mas isso não se sentiu no ritmo da publicação das suas
ilustrações. Restabelecido, conseguiu recuperar rapidamente o avanço perdido.
Capa e prancha do "Fandaventuras Especial" # 1, onde se recupera a 1.ª parte de "O Gavião dos Mares" |
Nessa época não era costume os autores entregarem a
história completa antes do início da publicação e acontecia até, embora o
argumento estivesse alinhavado desde o princípio, fazerem alterações, às vezes
por influência de alguma opinião vinda do público mais chegado que ia
acompanhando a história.
Eu próprio tive um percalço na História em Quadrinhos que publiquei nesse jornal. Dei-lhe o título de «O Reino Proibido» e tinha um
avanço considerável, pois o jornal continuava a ser bi-semanal.
Em dada altura a equipa foi deslocada para Coimbra, pois
tínhamos de montar uma exposição na Universidade; o trabalho prolongou-se mais
do que o previsto e esgotou-se o avanço que tinha da história sem ter no local
condições para continuar a desenhar a continuação.
O Raul Correia estava desesperado e ia escrevendo no
jornal, «que por doença do autor ainda
não nos é possível neste número…»
Mas só consegui terminar as pranchas em falta quando
regressei a Lisboa. Curiosamente, nesse espaço de tempo o formato do jornal
havia sido alterado, para o dobro. Valeu-me fazer os originais duas vezes
maiores do que o tamanho da publicação.
(Continua)
No próximo artigo: A TERTÚLIA NA REDAÇÃO DE «O MOSQUITO»
Sem comentários:
Enviar um comentário