José Baptista (1935-2013) |
Como tantos outros autores da sua geração, frequentou a Escola António
Arroio, em Lisboa, onde tirou o Curso de Desenhador-Litógrafo.
Fez carreira na Agência Portuguesa de Revistas, onde paginou, legendou,
remontou e retocou imagens durante muitos anos nas diferentes publicações da
editora. Fez também capas, colecções de cromos e ilustrações para livros da APR.
A sua primeira banda desenhada foi a adaptação do épico filme italiano “Ulisses”
(protagonizado por Kirk Douglas, Silvana Mangano e Anthony Quinn). Foi
publicada, em 1956, na Colecção Condor (6.º volume, fascículo 57), tendo, em
2004, sido recuperada e publicada, em pranchas semanais, n’ O Louletano e reeditada em formato de
fanzine, em 2005, na Colecção Cadernos Moura BD (edição da Câmara Municipal de
Moura).
Capas da "Colecção Condor" e dos "Cadernos Moura BD", onde Ulisses foi publicado
Realizou também “A Conquista de Lisboa”, “O Voto de Afonso Domingues” e “Luís Vilar” (2 episódios).
Pranchas de "O Voto de Afonso Domingues" ("Mundo de Aventuras")
Nos anos 70, fez parte da equipa (chegou a ser director) do “Jornal do Cuto”, onde ilustrou contos de Raul Correia, desenhou capas e publicou “Trinca-Fortes”, uma história curta sobre a vida de Camões. Nesta fase começou a utilizar o pseudónimo "Jobat".
Ilustração para "Trinca-Fortes" ("Jornal do Cuto") |
Mais tarde, e já com texto de Michel Gérac,
voltou ao tema e trabalhou em quatro dezenas de pranchas “A Vida Apaixonada e Apaixonante
de Camões”, que publicaria no Diário Popular, e num álbum em língua francesa.
Desenhou depois, para Inglaterra, uma série de histórias sobre a II Guerra
Mundial.
Em 1975 iniciou a publicação, no Diário Popular, da série, em tiras,
“Requiem para uma Ditadura”, que ficaria incompleta até hoje.
Tiras de "Requiem por uma Ditadura" |
Jobat, durante a Cerimónia de Entrega de Troféus do Moura BD 2005, ladeado pela neta e por Luiz Beira, Mara Mendes (autora) e Celeste Barata (da CM Moura) |
Nessa noite, e durante
o habitual convívio que se estabelece ao jantar, Jobat recusava-se a desenhar um “boneco” no Livro
de Honra do Moura BD (onde os autores que visitam o salão costumam, de modo
informal e descontraído, desenhar, escrever e autografar). “Que já não tinha
mão” - dizia repetidamente, enquanto se deliciava a folhear o livro e a admirar
os desenhos de muitos dos seus colegas.
Por fim, e ante a insistência geral, lá acedeu, ainda que com alguma relutância. E a verdade é que, enquanto
Jobat esboçava, em poucos minutos, um duelo de “cowboys”, todos
percebemos que continuava a desenhar magnificamente, como sempre fizera.
Jobat, autografando o Livro de Honra do Moura BD (fotos: Machado-Dias)
Lembro-me que era muito cioso dos seus desenhos. Quando nos deslocámos a sua casa, em Loulé, para ir buscar os originais que expusemos no salão Moura BD 2005, estava à nossa espera com os originais... e com uma lista detalhada de todo o material que nos emprestava.
Entre esse material contavam-se várias ilustrações a tinta da china com temática "western". Tratava-se de algumas das centenas de desenhos que José Baptista fez para colecções como "Cowboy" ou "6 Balas" (pequenos "livrinhos" com histórias do Oeste que traziam meia dúzia de ilustrações no miolo e que se publicaram entre o princípio dos anos 60 e meados dos anos 80).
Como tantos jovens da minha geração, li e reli muitos dos títulos dessas e de outras colecções e admirei, vezes sem conta, os soberbos desenhos que ilustravam os textos, longe de saber que o ilustrador era o José Baptista. Soube-o nessa altura, quando vi os desenhos e reconheci, imediatamente, o traço do artista.
Troquei algumas impressões com ele acerca disso, tendo-me dito que o método de trabalho era muito simples: a editora fazia-lhe chegar um resumo do texto e ele escolhia meia dúzia de cenas que desenhava a tinta da china (de início em papel Canson, depois em vegetal, por ser mais barato) e que remetia para a editora à razão de algumas dezenas por semana! "Eu fazia aquilo já de forma automática, tantos foram os desenhos que criei!" - dizia-nos.
Exemplos de algumas das ilustrações que Jobat fez para as colecções "Cowboy" e "6 Balas"
Terminado o Moura BD 2005, regressei a Loulé para entregar todo o material. Depois de conferirmos que tudo estava certo, ganhei coragem para lhe pedir um desses desenhos. Dado o cuidado que tinha com os seus originais, pensei que fosse recusar mas, para meu espanto, ofereceu-me dois, quase sem pestanejar, autografando-os na hora. Ainda hoje os mantenho emoldurados no meu ateliê, junto aos desenhos que outros autores me têm oferecido.
Anos mais tarde, no início
de 2009, convidámo-lo a participar no álbum colectivo “Salúquia: a Lenda de
Moura em Banda Desenhada”. Dessa vez, infelizmente, José Baptista foi mesmo obrigado a
recusar, uma vez que problemas de visão recentes não lhe permitiam desenhar.
Depois disso, encontrámo-lo um
par de vezes mais, no Festival da Amadora. Sempre afável e educado. Aqui e ali com o leve sotaque algarvio a denunciar as suas origens. É dessa forma que o recordaremos.
Deixou-nos na sexta-feira, aos
77 anos, vítima de doença prolongada. Que descanse em paz!
CR
Dados biográficos retirados, com a devida vénia, do Dicionário de Autores Portugueses de Banda Desenhada e Cartoon em Portugal, de
Leonardo De Sá e António Dias de Deus, Edições Época de Ouro (1999)
Página de "O Louletano", onde Jobat coordenava a rubrica "9.ª Arte - Memórias da Banda Desenhada", e onde publicou, entre outras, a história "Luís Vilar em Um caso de Contrabando" |
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